quarta-feira, 6 de outubro de 2010

ANGOLA NA ASCENSÃO SOCIAL PERNAMBUCANA, 1658 A 1666. - LEANDRO NASCIMENTO DE SOUZA


INTRODUÇÃO

Analisando a sociedade brasílica no século XVIII e XIX, vemos uma dependência do sistema social estabelecido com a mão-de-obra escrava. Essa dependência foi fruto do projeto português em aumentar cada vez mais a travessia de escravos da África para o Brasil, pois desde a captura dos africanos até a chegada deles no novo mundo, existia uma série de licenças e impostos que geravam um grandioso lucro para a Coroa portuguesa. Mas, para esse sistema escravista português consolidar-se, houve, na segunda metade do século XVII, grandes mudanças na estrutura do trato negreiro africano, principalmente no período dos governadores luso-brasileiros em Angola. Nos governos angolanos de João Fernandes Vieira (1658-1661) seguido pelo de André Vidal de Negreiros (1661-1666), foi colocado em prática as mudanças estruturais necessárias para retomar o controle e prestígio português na África, ampliando o tráfico de escravos no eixo entre Pernambuco e Angola. É justamente nesse contexto da recuperação de prestigio e poder lusitano que ocorreu uma grande demanda de militares que estavam na colônia brasileira e que atravessaram o Atlântico e lutaram em terras africanas. Esse intercâmbio militar entre Pernambuco e Angola vai ter seu ápice. A experiência adquirida na expulsão holandesa foi de fundamental importância para o sucesso na retomada do tráfico africano.

FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

Fazendo uso da teoria do historiador inglês Edward Palmer Thompson, podemos analisar a sociedade colonial da segunda metade do século XVII, o “fazer- se” dos membros da sociedade na colônia portuguesa estava atrelado ao interesse dos homens e mulheres em suas ações e relações sociais. Como relação histórica, um grupo relaciona-se com outro. Os grupos se definem pela sua história e como formação social e cultural, que só adquire existência ao longo de um processo histórico que envolve as experiências dos colonos. As experiências dos militares pernambucanos sejam oficiais, soldados ou recrutas, enquanto sujeitos históricos e agindo em prol de uma ascensão social, são de fundamental importância para a compreensão dos fatos ocorridos em Angola e em Pernambuco nos anos de 1658 a 1666, pois foi através do seu “fazer-se” que militares brancos e negros em Pernambuco tiveram suas vidas alteradas pelas lutas em território angolano, modificando assim a história do tráfico de escravos desse período, participando como “sujeitos da história” na consolidação do império ultramarino português.

MÉTODOS

Para essa pesquisa foram selecionados documentos do Arquivo Histórico Ultramarino de Lisboa, em cópias micro-filmadas pertencentes ao Laboratório de Ensino e Pesquisa de História - LAPEH, da Universidade Federal de Pernambuco. Esses documentos, da segunda metade do século XVII, mostram parte das consultas enviadas de Pernambuco ao Rei, analisada pelo Conselho Ultramarino. Com essa correspondência podemos observar diversos assuntos relacionados ao tema proposto, como: pedidos de patente e de soldos atrasados, de soldados e oficiais que tinham lutado em Angola; pedidos de socorro dos governantes angolanos aos governantes de Pernambuco; notas e recibos das mercadorias comercializadas entre Pernambuco e Angola; solicitação de cargos governamentais e militares em Angola; solicitações de soldados e armamentos para guerra contra o reino do Congo; entre outros. O conteúdo dessas cartas proporciona relatos de indivíduos cuja história se entrelaça com o tema a ser investigado. As lacunas que a documentação proporciona foram preenchidas pela vasta bibliografia da época, mostram o contexto histórico do império marítimo português na segunda metade do século XVII, seus desafios, conflitos, interesses e superações. Principalmente por cronistas como Cardonega e Cavazzi.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Após a expulsão holandesa da capitania de Pernambuco, via-se um cenário de grandes oportunidades no campo militar. Com prestigio na Corte, os colonos em Pernambuco aproveitaram a situação para ascender socialmente através das forças militares. Sempre houve o risco de uma nova invasão e a ordem tinha que ser restabelecida, logo a necessidade de ter um bom contingente militar era fundamental. A experiência holandesa mostrou que grandes feitos tinham grandes recompensas e a expansão portuguesa em Angola foi a grande oportunidade para muitos soldados e recrutas melhorarem de vida, além de que os governadores angolanos, Vieira e Negreiros, incentivaram muito essa travessia atlântica. Muitas solicitações de cargos em Angola eram realizadas, muitos retornavam de Angola e solicitavam aumento de patentes e de soldos, recompensa pelos seus feitos. Através das solicitações escritas ao Reino, alguns militares conseguiram o reconhecimento. Outros que tinham uma nova chance de vida foram os degredados, devido a "crimes" e motivos religiosos. Vistos como altamente perigosos, tinham em grande parte, cometido crimes relativamente menores. Tiveram em Angola a oportunidade de recomeçar. Outro caso importante é a questão dos negros, muitos tiveram sua alforria na luta contra os holandeses, podemos dizer que a primeira tropa militar de negros no Brasil fora em Pernambuco, com o Terço dos Henriques10. Aproveitando esse prestígio, muitos negros embarcaram para Angola e tinham a oportunidade de ter uma vida relativamente melhor no exercito ou até mesmo uma chance de fuga e deserção no retorno ao seu continente natal.

CONCLUSÕES

Passando pelos conflitos entre as nações européias, vimos que a relação Brasil-África estava sempre presente e que as disputas por essas colônias foram acirradas, pois a captura e a travessia atlântica de escravos geraram grande lucro para as nações nesse período, e na seqüência com a produção açucareira. Vimos que Portugal, apesar de toda a dificuldade, conseguiu manter-se durante três séculos a frente dessa empreitada, usando de toda a sua estratégia política para manter seu império ultramarino. E seu grande diferencial com relação aos outros países pode ter sido justamente essa infiltração no interior africano. Os “heróis” pernambucanos João Fernandes Vieira e André Vidal de Negreiros tiveram uma grande importância na manutenção do império português. Através de suas políticas expansionistas, abriram os caminhos para que os “comuns”, soldados, recrutas e até mesmo oficiais militares usassem a situação conflituosa em Angola para serem reconhecidos perante a Coroa portuguesa, proporcionando a possibilidade de uma ascensão social numa sociedade voltada para o escravismo e produção açucareira. Através de um jogo de interesses entre a Coroa Portuguesa, a aristocracia açucareira pernambucana, e os colonos militares, o império português se moldou e de certa forma consolidou-se. Através do lucro Real com as taxas e impostos do trato negreiro, do lucro da aristocracia açucareira com um aumento na produção, e do lucro dos militares com a oportunidade de ascensão social, reafirmamos que a necessidade individual é que realmente move os “sujeitos históricos” no seu “fazer-se”.

PALAVRAS-CHAVE: Ascensão social. Pernambuco. Angola.

REFERÊNCIAS

Arquivo Histórico Ultramarino, caixas de Pernambuco: 6, 7, 8, 10 e 11.

ALENCASTRO, Luiz Felipe de. O trato dos viventes: Formação do Brasil no Atlântico Sul. São Paulo: Companhia das letras, 2000.

CADORNEGA, Antonio de oliveira de. História geral das guerras angolanas: 1680. Lisboa: Agência geral do Ultramar, 1972.

THOMPSON, E.P. A Miséria da Teoria ou um planetário de erros: Uma crítica ao pensamento de Althusser. Rio de Janeiro: Zahar, 2009.

THORNTON, John. A África e os africanos: na formação do mundo Atlântico, 1400-1800. Rio de Janeiro: Campos, 2003.




LEANDRO NASCIMENTO DE SOUZA

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